Animais

Cientista defende que os animais também pensam

NOVA YORK – O Dr. Donald Griffin esteve no zoológico do Central Park observando ursos polares que esfregavam seus narizes em uma pedra sintética recheada com um creme de amendoim. “Eles gostaram muito do creme”, nota Griffin, enquanto olha para Gus, que pesa 400 quilos, tentando enfiar seu nariz em um suculento buraco da pedra.

Para algum desavisado a cena poderia parecer somente mais um dos tantos episódios de alimentação de animais no zoológico, mas ao exercício com a pedra e o lanche no Central Park cabe o nome bem mais honroso de “aperfeiçoamento animal”, e é destinado a estimular a mente dos ursos, assim como seus apetites. Trata-se de um conceito por cuja criação os ursos deveriam agradecer, em grande parte, a Griffin, que está com 85 anos de idade.

Há vinte e cinco anos, ele publicou um pequeno livro que sugeria que os humanos não contavam com o monopólio dos pensamentos e dos sentimentos. Os animais, ele argumentava, provavelmente também os possuíam.
Os cientistas ficaram horrorizados. De acordo com a teoria behaviorista dominante naquela época, os animais eram pouco mais que “autômatos capazes de responder a estímulos”, robôs que possuíam um sistema nervoso central.

A idéia de que uma formiga ou um elefante pudesse ter pensamentos, representações, experiências ou crenças não era somente risível: era sediciosa. Após Griffin ter publicado um segundo breve estudo a respeito da consciência animal na década de 1980, um behaviorista classificou o trabalho como “‘Os versos satânicos’ do comportamento animal”.

Não fosse pelo fato de que ele ocupava uma posição respeitável na Universidade Rockfeller e uma reputação internacional, Griffin talvez viesse a perder seu emprego. (Quando era estudante de graduação em Harvard, na década de 1940, ele contribuiu para resolver um mistério: de que maneira os morcegos voavam no escuro, e cunhou o termo ecolocação para descrever o fenômeno).

“Ele insistia para que as pessoas examinassem a consciência animal numa época em que ela era considerada antropomórfica e etérea”, afirmou Sarah Blaffer Hardy, uma professora emérita de antropologia da Universidade da Califórnia em Davis. “Qualquer outro teria sido execrado”.

Porém o campo batizado por Griffin como etologia cognitiva ao final acabou vingando. Somente na última década surgiu uma avalanche de novos dados que parecem ter feito com que a maré virasse a seu favor. No Arizona um papagaio africano chamado Alex é capaz de identificar cores e formas tão bem quanto qualquer criança de uma pré-escola. Na Georgia um macaco bonobo chamado Kanzi dialoga com seu treinador pelo teclado de um computador e assiste filmes de Tarzan na televisão.

Pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT) apresentaram um estudo que sugere que os ratos sonham. Programas de aperfeiçoamento animal que apresentam jogos de raciocínio sob o disfarce de brinquedos ou brincadeiras tornaram-se uma parte da vida diária dos zoológicos. E nesta primavera, a editora da Universidade de Chicago publicará uma edição atualizada do livro lançado por Griffin em 1992, “Mentes animais”.
Mas Griffin, um homem alto, magro e elegante e que possui uma predileção especial por gravatas com temas do mundo animal, é modesto demais para dizer que estes avanços são uma conquista sua. “Aquilo que sabemos ainda é muito pouco”, ele diz. “Os cientistas, e eu me incluo entre eles, passaram a ser muito cautelosos. Os primeiros trabalhos a respeito da gestualidade e das expressões faciais dos primatas foram terrivelmente mal interpretados”.

Na verdade, as recentes descobertas parecem somente ter incendiado o debate a respeito da consciência animal que já vinha sendo travado entre filósofos, psicólogos e outros cientistas. Pois se se verificar que os animais podem pensar, então a idéia de que a consciência é um atributo único dos humanos – um dos postulados básicos do ocidente desde Descartes – torna-se insustentável.

Gus, Alex e Kanzi certamente não são autômatos cartesianos, mas qual o seu grau de consciência? Eles vivenciam a dor, o desejo e outras sensações da mesma forma que os humanos? (Os filósofos definem isto como a consciência fenomênica). Eles são capazes de refletir a respeito de suas experiências? (Os filósofos definem isto como auto-consciência). Eles possuem crenças? E quanto a lembrar do passado? Será que os vermes possuem alguma forma de consciência? E as salamandras? Será que é possível estudar a vida interior de uma animal?

Fonte: THE NEW YORK TIMES – 05/02/2001

Sobre o Autor