Ciências

O que não nos mata, realmente nos deixa mais fortes?

“O que não te mata, te deixa mais forte” é uma das frases mais ditas e ouvidas no mundo. Essa é uma frase que geralmente é usada para consolar pessoas que estão enfrentando uma grande frustração. Literalmente significa dizer que experimentar adversidades vai te preparar para lidar com novas adversidades. O problema é que essa máxima é dita quase como se fosse algo positivo, ou científico; mas na verdade, as coisas podem ser muito diferentes.

A máxima também faz parte de uma cultura na qual se acredita que o sucesso só pode ser alcançado mediante o sofrimento. Isto é, se você não sofrer, se não derramar sangue, lágrimas e suor, então jamais será capaz de alcançar seus objetivos. A mesma máxima sugere que toda dor traz um aprendizado, que toda frustração te prepara para algo ainda maior. Será que é verdade? Não é nisso que acredita a psicóloga Eranda Jayawickreme.

Jayawickreme se dedicou por anos ao estudo do “crescimento pós traumático” e falou recentemente ao Hidden Brain sobre suas descobertas. A pesquisadora acredita que, ainda que a frase não esteja de todo errada, certamente também não é inteiramente certa e nem acarreta uma reação positiva. O que pesquisas revelam, na realidade, é que não existe uma métrica que garanta que eventos traumáticos sejam melhores formadores de caráter do que eventos positivos.

Um artigo sobre o tema publicado no American Psychological Association, por exemplo, diz o seguinte:

Não encontramos nenhuma evidência geral para a convicção generalizada de que eventos de vida negativos têm um efeito mais forte do que os positivos. Nenhum crescimento genuíno foi encontrado para significado e espiritualidade. Na maioria dos estudos com grupos de controle, os resultados não diferiram significativamente entre evento e grupo de controle, indicando que as mudanças nas variáveis ​​de resultado não podem ser simplesmente atribuídas à ocorrência dos eventos de vida investigados.

Apesar das conclusões, a verdade é que a pesquisa desse tipo de tema é bastante delicada porque você não pode simplesmente induzir alguém a um trauma. Não à toa, um grupo de pesquisadores decidiu driblar essa barreira de uma maneira muito curiosa: permaneceram observando seus voluntários por um longo período, até que um evento traumático acontecesse de fato. O artigo foi publicado no Psychological Science e trouxe alguns dados interessantes. Os pesquisadores aplicaram um formulário em 1200 alunos de graduação, a idade foi propositalmente escolhida por ser uma fase na qual estamos no auge da exposição a traumas. Dois meses depois, o formulário voltou a ser aplicado junto a um questionário sobre os eventos mais recentes da vida dos voluntários, além disso, os voluntários também responderam a um questionário simples sobre aprendizado pós-trumático.

Durante o período da pesquisa, pelo menos 122 alunos afirmaram ter vivido experiências de grande potencial traumático (como, por exemplo, perder um amigo atropelado por um motorista bêbado). Em todos os casos, os estudantes descreveram ter enfrentado extremo sofrimento com as experiências. O que os pesquisadores perceberam com os questionários é que não é possível afirmar ou descartar por completo que experiências traumáticas possam gerar mudanças positivas na vida das pessoas; no entanto, isso não significa que toda experiência traumática vai levar a um grande aprendizado, ou crescimento pessoal.

Ao mesmo tempo, profissionais da saúde mental, como a pesquisadora Jayawickreme, questionam o que esse tipo de máxima pode estar ensinando e como pode estar maximizando o sofrimento. “Pense no que ele comunica: o sofrimento é bom a longo prazo, e as pessoas que sofreram traumas são mais fortes do que aquelas que não sofreram”, provoca. Esse tipo de pensamento pode ampliar a sensação de frustração naqueles que, após uma experiência traumática, não são capazes de identificar nenhum aprendizado ou crescimento.

 

Sobre o Autor

Roberta M.

Gosto de escrever sobre diversos assuntos, principalmente curiosidades e tecnologia. Contato: [email protected]