Uma das maiores preocupações das pessoas sobrecarregadas de tensões e responsabilidades é encontrar meios de atenuar os malefícios causados à saúde pelo estilo de vida excessivamente acelerado. É claro que o ideal seria viver de maneira menos insana. Mas, diante das dificuldades de romper individualmente com esse modo de vida adotado por toda a sociedade, só nos resta buscar paliativos para nossas dores cotidianas: massagem, esportes, meditação, lazer, caminhada, hobbies.
Entre as inúmeras atividades que funcionam como válvula de descompressão, a de efeitos mais instantâneos é a relação sexual de boa qualidade. Assim como as massagens relaxantes e os exercícios de meditação, o sexo traz leveza para o corpo e a mente. O envolvimento com as carícias eróticas nos transporta a um mundo etéreo. Esquecemo-nos das mazelas cotidianas, das dificuldades financeiras, dos problemas de saúde e dos dilemas que afligem o país.
Não é fácil fazer essa transição do caos para o desligamento total. No entanto, quanto maior a entrega e a concentração no estímulo às zonas erógenas, mais rapidamente entramos no clima de excitação. Por isso, vale a pena se esforçar nessa conquista, mesmo quando não nos sentimos espontaneamente predispostos ao sexo.
No início da relação sexual, só temos olhos para o parceiro e para nós mesmos: empenhamo-nos em saciar mutuamente os desejos, em preencher expectativas, em dar e obter prazer. Estamos focados no que está acontecendo conosco, no ambiente que nos cerca e no desenrolar do sexo – o resto do mundo já deixou de ser problema nosso.
A partir do ponto em que nos aproximamos do orgasmo, nada mais nos interessa. Nosso pensamento pára, exatamente como acontece numa meditação bem-sucedida, e nos entregamos incondicionamente ao pulsar da nossa sexualidade. Trata-se de um momento mágico, de total mergulho em nós mesmos e na urgência da nossa excitação. Nessa hora – insisto em afirmar – não existe comunhão. Usufruímos da mais absoluta e deliciosa solidão! O parceiro está no mesmo estado, voltado para si, para o seu silêncio interior.
O clímax sexual é seguido de um período de exaustão física e talvez psíquica – que leva alguns homens a cochilar. Depois vêm o relaxamento e a sensação de leveza, que protegem nossa mente dos conflitos diários. Quando retornam, conseguimos encará-los com olhos mais críticos e generosos. Sob a ótica do prazer, a vida ganha simplicidade e as coisas prazerosas, outro significado.
Mas só alcança esse relaxamento benéfico quem não usa o sexo para manipular ou dominar o parceiro, nem o instrumentaliza para exercitar seus ressentimentos. As pessoas empenhadas apenas em impressionar na cama acabam transformando o ato em mais um fator de estresse. Tudo o que deveria ser lúdico torna-se pesado, premeditado pelas metas a serem atingidas.
A experiência nos ensina que pouca gente é capaz de tirar do sexo prazer e estímulo para a vaidade saudável – a que nos impulsiona a cuidar do corpo para manter nosso fôlego em forma e nossa aparência atraente. Não me refiro ao consumismo desvairado, às cirurgias estéticas desnecessárias, às dietas compulsivas, ao apego doentio aos exercícios e a outros excessos cometidos na busca da perfeição. Falo do encontro consigo mesmo, do autoconhecimento. Essa seria a verdadeira emancipação sexual, aquela que liberta as pessoas do sexo de segundas intenções e as preenche com sentimentos genuínos e transparentes, fundamentais para levar a vida com a leveza e a sabedoria das crianças.
Fonte:
Artigo de Flávio Gikovate, publicado no endereço: Flaviogikovate.com.br